Fluxo de caixa da firma e do acionista são terminologias ligadas à metodologia de avaliação de empresas feita pelo fluxo de caixa descontado.
É importante iniciar a discussão explicitando o conceito de firma que procura contemplar o interesse dos stakeholders de uma companhia, isto é, os credores e os acionistas. Essas são as figuras que investem na companhia com o intuito de receber juros (credores) e dividendos ou ganho de capital (acionistas). Se analisarmos uma demonstração de resultados (DRE), podemos afirmar que até o pagamento de juros para os credores representada pela conta de despesas financeiras, o resultado da companhia foi construído com recursos próprios e de terceiros, ou seja, todas as linhas da DRE acima do Lucro antes do IR pertencem ao acionista e ao credor.
Para nos adequarmos a terminologias específicas do fluxo de caixa descontado é importante fazer algumas observações para que não haja confusão sobre os termos firma, companhia e empresa:
Valor da companhia (company value) = valor de mercado = número de ações x valor da ação (dimensão somente do acionista)
Valor da empresa (enterprise value) = valor da firma = valor da companhia (número de ações x valor da ação) + Valor da dívida bruta (dimensão do acionista e do credor)
Primeiras distinções
Fluxo de Caixa para o Acionista ou Free Cash Flow to the Equity (FCFE) contempla apenas o que sobra do fluxo de caixa da empresa para ser distribuído para os detentores do capital próprio, após o pagamento de juros para os credores. Por pertencer somente aos acionistas, o FCFE parte do lucro líquido (credores já foram pagos). O FCFE deve ser descontado pelo custo do capital próprio (Ke) para obtermos o valor de mercado (market value) que, dividido pelo número de ações emitidas, determina o preço da ação.
Fluxo de Caixa para a Firma ou Free Cash Flow to the Firm (FCFF) abrange todo o fluxo de caixa da empresa a ser distribuído entre os credores e acionistas, sob a forma de juros e dividendos. Por pertencer tanto aos debtholders quando aos stockholders, o FCFF parte do lucro operacional após impostos (EBIT * (1-t) ). O FCFF deve ser descontado pela média ponderada entre o custo de capital próprio e de terceiros (WACC) para obtermos o valor da empresa (enterprise value)
Fluxo de caixa descontado para o acionista = Valor de mercado da companhia
Fluxo de caixa descontado para a firma = Valor de mercado da companhia + Dívida total
O fluxo de caixa, seja para a firma, seja para o acionista, deve abranger o que sobra para os acionistas e credores (FCFF) e somente para os acionistas (FCFE) depois de investimentos (capital físico e capital de giro), sejam esses obrigatórios (para repor a depreciação e manter a atividade na empresa) ou investimentos líquidos para estimular o crescimento da companhia.
Analisando o Fluxo de Caixa para o Acionista (FCFE)
O Fluxo de Caixa para o Acionista representa a diferença entre toda a entrada e saída efetiva de recursos no nível do acionista (por isso parte do lucro líquido) em determinado período. É extremamente importante, para não penalizar o verdadeiro valor da companhia, considerar que parte do investimento projetado no fluxo será financiada por capital de terceiros (dívida).
O FCFE é calculado por:
Lucro Líquido
+ Despesa de depreciação
- CAPEX
- Variação na necessidade de capital de giro
+ todos os itens sem efeito caixa na DRE, além da depreciação
+ emissão de novas dívidas
- pagamento do principal da dívida
+ Variação no Capital
=FCFE
Observações: A entrada de mais dívida aparentemente "beneficia o fluxo de caixa", mas no curto prazo reduz (ceteris paribus) o lucro líquido, pois aumenta as despesas financeiras. Mais para frente, as amortizações contraem o fluxo e só haverá agregação de valor ao fluxo se o retorno sobre o capital emprestado for superior ao custo do empréstimo durante o prazo do endividamento.
Analisando o Fluxo de Caixa para a Firma (FCFF)
O objetivo é calcular quanto vale a empresa que "pertence" tanto aos acionistas quanto aos credores.
Enterprise Value = Market Value + Total Debt
Os recursos para financiar as atividades da empresa virão ou do capital próprio ou de terceiros, portanto não há necessidade de se utilizar o fator "w" previamente dito.
O ponto de partida do FCFF é o lucro operacional, EBIT * (1-t) (antes do resultado financeiro):
EBIT *(1-t) - Lucro operacional depois dos impostos
+ depreciação
- CAPEX
- Variação na necessidade de capital de giro
+ todos os itens sem efeito caixa na DRE, além da depreciação
=FCFF
Você pode estar se perguntando que como o fluxo de caixa para a firma não considera juros e mudanças na estrutura de capital, essas questões estariam sendo ignoradas na conta do fluxo de caixa descontado. Entretanto, achar isso é incorreto, pois as mudanças em relação aos juros e a estrutura de capital são levadas em consideração no cálculo do WACC, denominador que desconta o fluxo.
A questão da depreciação: Existem alguns itens na DRE que são puramente contábeis, devendo ser repostos no lucro da empresa para que haja um reflexo mais fidedigno da geração de caixa. Depreciação não é caixa, por isso deve voltar integralmente ao fluxo de caixa. Todos os itens contábeis que não representam desembolso efetivo devem ser levados em conta na formação do fluxo de caixa.
A partir do regime de competência, depreciação deve ser entendida como uma despesa de produção, relativa à utilização de determinado equipamento anualmente. O único efeito da depreciação no fluxo de caixa é a geração de um benefício fiscal que deve ser utilizado no futuro para conservação da máquina e compra de novos equipamentos.
Quais os critérios de escolha entre o FCFF e o FCFE?
É importante ressaltar que não há forma melhor ou pior, errada ou correta. Ambos buscam atingir o resultado de calcular o valor justo da empresa (valor de mercado). O critério básico de escolha de uma metodologia ou outra reside no estágio de estrutura de capital da empresa analisada:
FCFE: Deve ser usado quando a empresa em questão não tem perspectivas relevantes de mudança na estrutura de capital no futuro. É a opção mais indicada, pois não será necessário projetar juros a serem pagos e contração/pagamento de dívidas. Normalmente, são empresas mais maduras.
FCFF: Deve ser usado quando a empresa em questão tem perspectivas relevantes de mudança na estrutura de capital. A opção mais correta é o FCFF, pois reconhece as mudanças na estrutura de capital na taxa de desconto (WACC) de maneira mais direta. Normalmente, são empresas iniciantes e pertencentes às indústrias em permanente evolução.
Transformação do Fluxo de caixa para o acionista no fluxo de caixa da firma:
Primeiramente, devemos devolver o custo da dívida e o respectivo benefício fiscal (na firma, o credor ainda não foi pago).
FCFE
+ juros pagos* (1-t)
- (Investimento Líquido = novos investimentos - depreciação)
- (Variação da necessidade de capital de giro)
- Aumento de capital
- Emissão de novas dívidas
+ Pagamento de amortização e principal
=FCFF